Carta da Assembleia Extraordinária do povo Munduruku para a Presidenta da República Dilma Roussef
Foto: Povo Munduruku-Aldeia Teles:7.11.2012
A
presença inusitada de um funcionário da empresa de consultoria
ambiental, Ecology, ligada a Eletrobrás causou estranhamento nos
indígenas. Questionado sobre sua procedência, o funcionário ora alegou
ser do Ministério Público Federal, outrora da Funai, mas os indígenas
conseguiram desmascará-lo e apreenderam pacificamente anotações e
filmagens que portava consigo. “Pedi para ele se explicar na plenária,
pois as pessoas não sabiam quem ele era. Avaliamos que essa pessoa
estava fazendo espionagem para levar às empresas estratégias sobre como
implantar projetos e viabilizar os estudos na região, ou ainda,
visualizar quem são as principais lideranças”, aponta Marcos Apuriña,
coordenador da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia
brasileira (Coiab).
A política desenvolvimentista do Governo Federal alimentada pelo
Programa de Aceleração e Crescimento (PAC), também foi criticada pelos
indígenas. “Questionamos a política da presidente Dilma. Não vamos
permitir qualquer tipo de estudo sobre implantação de hidrelétricas na
região”, reitera Marcos Apuriña. (Fonte: http://www.cimi.org.br/site/pt-br/?system=news&action=read&id=6707)
PORTANTO:
1. A Coordenação das Organizações Indígena da Amazônia Brasileira – COIAB,
organização esta, que é representativa e articuladora dos povos
indígenas da região Amazônica, com representação nos 09 (nove) estados
da Amazônia Brasileira, criada para promover e defender os direitos
coletivos dos povos indígenas vem através de sua Coordenação Executiva: Marcos Apurinã-Coordenador Geral; Sônia Guajajara-Vice-Coordenadora, fazer menção a Carta em anexo, sobre a situação de vulnerabilidade em que a Terra Indígena Aldeia Teles Pires,
localizada no município de Jacareacanga no estado do Pará vem sofrendo,
visto que a invasão e a violência cometida pela Polícia Federal na
referida aldeia, no dia 7 de novembro de 2012 com a Operação Eldorado, e
que colocou assim, a aldeia indígena, sujeito a todo de tipo de
impactos sociais, ambientais e culturais.
2. Considerando que nos últimos anos, esta
coordenação, vem trabalhando em conjunto com as suas organizações de
base, realizando atividades, objetivando promover o fortalecimento e a
proteção territorial dessa região, onde podemos destacar a Constituição
Federal de 1988, a Declaração da ONU e a Declaração 169 da OIT, ambos,
garantem todos os direitos coletivos dos povos indígenas contra esse
tipo de empreendimento que venha a trazer prejuízos para a vida plena
dos povos indígenas.
3. Neste
sentido, a COIAB, solicita com tamanha urgência, a tomada das devidas
providências no que se refere ao solicitado pelo Povo Munduruku com o
ocorrido na Aldeia Teles Pires, no sentido de obter maiores
esclarecimentos na ação de cada órgão, cada um dentro de suas
competências, e que os mesmos, possam fazer valer os direitos coletivos
dos povos indígenas já constituídos.
O povo Munduruku do médio e alto rio Tapajós com a participação de
representantes dos povos- Kayabi, Apiaká e Kayapó; o coordenador Coiab;
representantes de entidades de apoio a causa indígena; representante da
Secretaria da Presidência da República, coordenadores e técnicos e da
presidência da Funai- discutiram no dia 31 de janeiro, de 2013 como
ponto principal da Assembleia Extraordinária, a invasão e violência
cometida pela Polícia Federal na Aldeia Teles Pires, no dia 7 de
novembro, de 2012.
Ato que resultou no assassinato do nosso parente indígena. Outro assunto
que também pautamos é a agressão aos nossos direitos pelos projetos do
Governo Federal na construção de hidrelétricas nos rios Teles Pires e
Tapajós, onde ficam nossas terras tradicionais.
A invasão da Polícia Federal na chamada Operação Eldorado foi
denunciada mais uma vez na Assembleia como brutal de desrespeito aos
direitos humanos e aos direitos indígenas, devido a humilhação e ameaças
feitas para idosos, mulheres, crianças e caciques, que resultou como
crime maior, o assassinato de um parente Munduruku que fugia dos tiros,
mas acabou sendo executado com balas nas duas pernas e outra na cabeça
pelo próprio delegado que comandava a operação assassina.
Não satisfeitos a Polícia Federal ainda atirou 13 bombas na beira do
rio para que o corpo desaparecesse e ficaram durante todo o dia
amedrontando à comunidade, depois do ato truculento de invasão das
casas, atiraram contra as paredes da escola e do posto de saúde.
Juntaram crianças, velhos e mulheres durante horas debaixo do sol. Após a
ação a Polícia Federal passou a divulgar na imprensa que foi atacada e
só reagiu com balas de borracha, pois os Munduruku estavam armados .
A Funai no dia 5 de dezembro assinou um documento alegando que a
polícia não agiu com excesso, mas como medida de defesa, o que o órgão
pretendeu foi passar para a população brasileira a imagem de que os
índios foram culpados, mais uma vez a ideia que o povo indígena é um
bando de selvagem. Tudo não passa de mentiras, por que o nosso povo não
tinha armas de fogo e tentou convencer o delegado para não usar a força
mostrando documentos que a comunidade já havia discutido com a Funai e
autoridades federais, com entendimentos para solução do problema do
garimpo.
Os dois indígenas baleados foram levados pela Polícia Federal para a
cidade de Alta Floresta, quando chegaram lá foram surpreendidos pela
Polícia Federal que cercou toda a área do aeroporto, a fim de que
nenhuma imprensa filmasse e divulgasse o que eles cometeram. Temos
informação que até tentativa de abuso sexual aconteceu conforme o relato
de Gersiane Bõrõ Munduruku, irmã do Edivaldo Bõrõ que estava baleado e
foi levado para a cidade de Alta Floresta. Ela foi acompanhar o irmão e
mandaram-o, deixando a indígena no porto da Fazenda Brascam, lá a
Polícia Federal mencionou que iam estuprá-la.
Embora outro integrante da Força Nacional tivesse afirmado que não
podiam fazer isso com a índia, o agente da Polícia Federal falou que ele
ia estuprá-la e posteriormente jogar seu corpo para jacaré comer, mas
felizmente a ameaça não foi concretizada.
"Senhora Presidenta! Tudo isso já foi denunciado para as
autoridades do Ministério da Justiça e do Ministério Público Federal, e
com certeza a senhora foi informada desse crime. Mas o pouco caso e
desrespeito continuam. Após dois dias do ocorrido fomos para Brasília
denunciar ao Ministério da Justiça e esperávamos sermos recebidos pelo
ministro, e pela presidenta da Funai, mas nenhuma das autoridades
estavam presentes.
Há anos que apresentamos ao Governo propostas
alternativas de auto-sustentação para o nosso povo a partir do nosso
costume com uso dos recursos da floresta, como óleo de babaçu e
castanha. Os anos foram passando e nada foi resolvido, agora como
resposta tivemos o ataque assassino na nossa comunidade. A ação da
Polícia Federal foi feita contra um povo que luta contra as
hidrelétricas, na tentativa de ameaçar e amedrontar-nos. Se o Governo
Federal não tem dinheiro para apoiar os projetos dos povos indígenas,
como possui milhões para realizar uma operação de violência contra nossa
aldeia?
Os parentes Munduruku, Kayabi e Kayapó presentes na
Assembleia falaram dos projetos do Governo de construção hidrelétricas
nos rios Teles Pires e Tapajós passando por cima da Constituição Federal
e ameaçando destruir a natureza, nossos lugares sagrados e a base de
nossa cultura e existência. Não somos contra o desenvolvimento do país,
mas não aceitamos ter nossa vida destruída em nome de um tipo de
progresso que só irá beneficiar os grandes empresários que ficarão cada
vez mais ricos. Os povos indígenas deram seu sangue e contribuíram
durante séculos com seu trabalho, suas vidas e suas riquezas para o
desenvolvimento da nação brasileira.
As empresas de construção de hidrelétricas fazem
promessas de compensação com muitos objetos e muito dinheiro, esquecendo
que nossa visão de mundo é diferente dos não-índios que a grande
maioria só pensam no lucro e na ganância. Não temos interesse nessas
promessas de riqueza, para nós povos indígenas o patrimônio principal da
riqueza é o futuro de nossas crianças e do nosso povo. O Governo
Federal quebrou a pernas e braços da Funai, pois essa ficou parada e não
tem mais força para defender os direitos indígenas. Mas, nós, Munduruku
não temos medo e vamos continuar resistindo contra os projetos de
hidrelétricas que ameaçam a nossa vida.
As prioridades do Governo não passam pela demarcação das
terras indígenas, nossos parentes Munduruku do médio rio Tapajós e os
parentes de outros povos do Baixo tapajós há muitos anos esperam pela
demarcação de suas terras que são durante todo tempo invadidas por
fazendeiros e madeireiros. Se o governo pode investir milhões nas
grandes hidrelétricas, como não tem dinheiro para priorizar os direitos
dos povos indígenas? É só olhar a situação da saúde, da educação, da
fiscalização das terras, das atividades produtivas, e de nosso
patrimônio cultural.
Essa carta é uma tradução e resumo das falas dos parentes durante as
discussões da manhã do dia 31 de janeiro, onde apresentamos para Vossa
Excelência as seguintes reivindicações, futuro dos anseios e angústias
do Povo Munduruku:
1. A apuração imediata do caso do assassinato do índio
Munduruku, Adenilson Kirixi, com o indiciamento e a punição do delegado
da Policia Federal que comandou a operação Eldorado;
2 . Abertura de inquérito para uma apuração rigorosa do caso da
violência acometida contra a vida e os direitos da comunidade Munduruku
pela Polícia Federal, na Aldeia Teles Pires;
3. A imediata indenização pelos bens perdidos na invasão
da Polícia Federal (balsas, casas, motores, barcos, etc...), assim como
moral da família do Adenilson Kirixi e da comunidade Munduruku, da
Aldeia Teles Pires;
4. A reconstrução imediata da Aldeia Teles Pires, do Povo Munduruku;
5. Fim dos estudos das hidrelétricas na Bacia do Tapajós e Teles Pires;
6. Revogação imediata da Portaria 303 da AGU;
7. A paralisação imediata da PEC 215;
8. Paralisação do projeto de Lei 1610.
9. A retomada imediata de estudo e aprovação do Novo Estatuto dos Povos Indígenas;
10. A aceleração no processo de demarcação das Terras Indígenas Munduruku da região do Médio Tapajós;
11. A implantação imediata e viável de um Programa de
Vigilância, Monitoramento e Proteção dos territórios Munduruku, Sai
Cinza e Kayabi;
12. A implantação imediata e viável de Projetos de Sustentabilidade para
o Povo Munduruku, como casa de farinha, piscicultura, artesanato e
outros projetos de produção de alimentos e geração de renda;
13. A garantia de recursos do PAR Indígena para a continuidade das etapas do Curso Ibaorebu, via a Funai;
14. Apoio do MEC para a regularização das escolas indígenas Munduruku,
com a construção de currículos próprios e projetos políticos e
pedagógicos específicos ao Povo Munduruku, reconhecidos pelo Governo
Municipal, Estadual e Federal;
15. Agilizar a imediata construção das Escolas Indígenas nas Aldeias Sai
Cinza e Missão Cururu, do Povo Munduruku, cujo os recursos federais
estão na SEDUC, do Governo do Estado do Pará;
16. A construção de um Centro de Formação Munduruku, na Terra Indígena Munduruku;
17. A implantação pelo MEC de um curso de nível superior
intercultural e específico por áreas de necessidades e interesses do
povo Munduruku;
18. A garantia de recursos para apoiar os estudantes do ensino superior;
19. A garantia de recursos para a realização de um Projeto de Formação Tradicional, como musica e flautas;
20. Garantir recursos federais para a realização de
cursos profissionalizantes nas áreas de saneamento, laboratório, técnico
de enfermagem e saúde bucal com o objetivo de melhorar o atendimento à
saúde do Povo Munduruku;
21. A imediata liberação de recursos para a construção dos postos de saúde, com os projetos já aprovados;
22. Agilidade nos processos de aquisição de medicamentos e
equipamentos médico hospitalares para os Postos de Saúde e CASAI´s de
Jacareacanga, Itaituba e Novo Progresso, do DSEI Tapajós;
23. Liberação de recursos para a implantação de uma Casa
de Apoio à Saúde Indígena na cidade de Santarém para as etnias Munduruku
e Kayapó;
24. Aquisição de meios de transporte (barcos, microônibus, caminhões,
ambulâncias, etc...) com estruturas para atender aos pacientes e aos
profissionais de saúde que trabalham na região;
25. A homologação das pistas de pouso nas Aldeias Sai
Cinza, Katõ, Kaburuá, Rio das Tropas, Waro a pompõ, Teles Pires, Posto
de Vigilância, Waritodi;
26. Criação do projeto intercultural superior.
27. Construção de pista de pouso aldeias polos santa Maria no rio cururu, Restinga rio Tapajós.
28. Punição dos servidores da FUNAI que estavam presentes na operação, Paulo e Moacir.
29. Homologação da T.I Kayaby.
30. Prioridade urgente do governo Federal para os estudos
e condições que garantam a proteção e sobrevivência dos índios isolados
da bacia do Tapajós, Teles Pires e Juruena.
31. Reforma urgente do prédio da FUNAI
em Itaituba garantindo condições de trabalho e atendimento de acordo com
as necessidades e direitos do povo indígena.
32. Que a Secretaria da Presidência da República cumpra o compromisso de
audiência com 20 representantes Munduruku em Brasília na primeira
quinzena de março assumido durante a Assembleia, quando deverão ser
apresentadas as respostas as nossas reivindicações.
33. Reiteramos que estas são as nossas reivindicações sobre os nossos
direitos e não os negociamos e, nada disso trará de volta também a vida
do nosso irmão Adenilson Krixi. Não irão intimidar-nos ou amedrontar-nos
com ameaças e ações violentas, pois a nossa decisão é continuar
defendendo até o ultimo guerreiro Munduruku, o nosso Rio, Tapajós e
Teles Pires, pois estes são a nossa vida.
Aldeia Sai Cinza, Pará, 31 de Janeiro de 2013.
Fonte: Secretaria/ASCOM-COIAB